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Artigos 24/11/2020

A possibilidade de extensão de cláusula compromissória disposta no contrato principal aos instrumentos assessórios

*André de Almeida, Eduardo Machado Tortorella e Júlia Molnar Terenna

Mesmo após o recente aniversário de 24 anos da Lei nº 9.307/96 (Lei de Arbitragem), muito ainda se discute com relação à sua aplicação. Isso porque, com seu uso gradativamente mais frequente e dada a relevância do tema considerando o congestionamento do Poder Judiciário, é natural que surjam algumas incertezas, sendo necessária, consequentemente, a pontual intervenção judicial para resolver questões relacionadas à aspectos processuais da arbitragem ou para interpretação das cláusulas arbitrais.

De início, vale mencionar que as cláusulas arbitrais abrangem duas modalidades: cláusula compromissória e compromisso arbitral. Enquanto a primeira deve ser inserida no bojo do contrato firmado por duas partes contratantes, a segunda é realizada apenas após o surgimento do conflito, visando estabelecer que o litígio se resolva por arbitragem, ao invés do Judiciário.

Embora as cláusulas compromissórias já se mostrem de amplo conhecimento e domínio do empresariado brasileiro, é de extrema importância que sua redação se dê de forma precisa e completa, a fim de evitar maiores conflitos dela decorrentes. Isso porque, a não observância de aspectos específicos podem gerar discussões desnecessárias e atrapalhar o início e bom andamento do procedimento arbitral, cuja escolha pelas partes, normalmente, ocorre justamente por se mostrar um método eficiente, célere e exitoso para resolução de conflitos de grande complexidade.

Um aspecto relevante das cláusulas compromissórias que vêm sendo amplamente questionado nos últimos anos diz respeito a possibilidade ou não de seu aproveitamento para os instrumentos acessórios ao contrato principal. Ou seja, discute-se se a previsão de arbitragem do contrato principal também impacta os demais contratos que se formam e existem em sua função, os quais, na prática, servem para garantir o cumprimento da obrigação basilar ajustada pelas partes. São comuns, dentre outros, a fiança, espécie de contrato acessório que geralmente garante uma locação principal, ou a hipoteca, tipo contratual que serve normalmente para garantir um empréstimo principal.

Sobre o tema, no último dia 16 de outubro de 2020, o Judiciário brasileiro deu um importante passo para resolver essa interessante discussão, ao decidir pela possibilidade de o contrato acessório abranger a cláusula compromissória inserta no contrato principal. Sendo assim, por meio do acórdão proferido pela Terceira Turma da Corte Superior, nos autos do Recurso Especial nº 1.834.338/SP, o Min. Marco Aurélio Bellizze entendeu ser possível a ampliação e abrangência da cláusula compromissória.

O mencionado julgamento mostra-se bastante emblemático e certamente terá grande impacto balizador para orientar decisões relacionadas à possibilidade ou não da extensão da cláusula arbitral para contratos coligados. Isso porque, é possível destacar que a Terceira Turma da Corte Superior solucionou o caso sob a ótica da perspectiva negativa, estabelecendo que a aplicação a todos os contratos mostra-se necessária justamente por inexistir qualquer previsão que vede sua aplicabilidade aos contratos coligados. Ou seja, no caso em questão, como não houve nenhuma ressalva no contrato principal ou nos acessórios, estendeu-se ser possível a abrangência da cláusula compromissória.

É de se mencionar, todavia, que o entendimento de extensão da cláusula não é válido indiscriminadamente a todas as hipóteses, sendo necessário analisar em maior detalhe não apenas o disposto na própria cláusula, como também o teor dos contratos em si. Por isso, prevaleceu o entendimento de que é possível aplicar a extensão da cláusula compromissória arbitral disposta nos contratos principais àqueles acessórios, quando neles não há nenhuma ressalva relativa à exclusão da possibilidade de resolução de litígios por meio da arbitragem.

Ante essas considerações, é clara a importância da elaboração bem-feita das cláusulas compromissórias, a fim de evitar maiores conflitos dela decorrentes, como esse relacionado à possibilidade ou não de sua extensão a eventuais contratos assessórios. Isso porque, a prática estabelece que as cláusulas arbitrais são tratadas como “midnight clauses”, ou seja, as últimas a serem discutidas e redigidas quando da elaboração dos contratos empresariais. A partir dessa situação, o cansaço pós elaboração de um documento extenso, somado muitas vezes com a pressa na execução da transação, faz com que as cláusulas compromissórias, por vezes, sejam elaboradas sem a observância de aspectos específicos do caso em questão, desta forma, gerando discussões desnecessárias entre as partes acerca de aspectos processuais.

Para além disso, o julgamento nos leva a crer que a cláusula compromissória deve ser estipulada não somente nos contratos principais, como também nos seus acessórios, se houver. Referida cláusula, no entanto, poderá ser tanto positiva, abrangendo a arbitragem (ou outro método diverso de solução de disputas) para a solução dos conflitos decorrentes dos contratos acessórios, quanto negativa, para excluir o mencionado método dos litígios deles decorrentes. Seja qual for a modalidade escolhida, a cláusula deve ser bem redigida a fim de evitar interpretações divergentes e/ou incorretas.

O Almeida Advogados conta com profissionais que possuem vasta experiência em âmbito societário e dos métodos alternativos de solução de conflitos e está à disposição para seguir contribuindo com a aplicação dos recentes precedentes dos Tribunais nacionais para a melhor assistência de seus clientes.

*André de Almeida, Eduardo Machado Tortorella e Júlia Molnar Terenna

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