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Notícias 27/04/2020

IRRF – Prêmios pagos a seguradoras estrangeiras

Em 02 de janeiro de 1975 foi promulgada no Brasil a “Convenção destinada a Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre a Renda” celebrada entre o Brasil e a Espanha. Dentre os diversos artigos que compõem a referida Convenção, sobressai o artigo 7º, segundo o qual os lucros de uma empresa situada em um desses Estados somente seriam tributáveis no Estado em que a empresa estivesse localizada, ressalvada a hipótese da empresa exercer sua atividade no outro Estado por meio de um estabelecimento permanente – caso em que o lucro atribuído ao estabelecimento permanente poderia ser tributado pelo outro Estado.

Tal artigo sempre foi tratado pela doutrina como o “coração” das Convenções para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal, e deveria ser aplicável a todo tipo de rendimento oriundo do desempenho das atividades das empresas, isto desde que esses rendimentos não fossem expressamente abarcados por outros artigos específicos dessas Convenções – como, por exemplo, dividendos, juros, royalties, ganhos de capital etc.

Apesar da existência dessa norma, não são raras as vezes em que empresas brasileiras se deparam com dificuldades em fazer a remessa dos rendimentos sem a retenção do Imposto de Renda (IRRF) no Brasil – seja em favor de beneficiário localizado na Espanha, seja em favor de beneficiário localizado em outros países signatários de Convenções semelhantes.

Isso ocorre, sobretudo, em razão de um histórico de manifestações exaradas pela Receita Federal do Brasil no sentido de que certos serviços, ainda que abarcados por Convenções para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal, deveriam observar os dispositivos legais internos que preveem a exigência do IRRF sobre pagamentos feitos ao exterior independentemente da existência de um estabelecimento permanente.

Por exemplo, o Ato Declaratório Normativo COSIT nº 01/00 indicava que “as remessas decorrentes de contratos de prestação de assistência técnica e de serviços técnicos sem transferência de tecnologia” deveriam ser enquadradas nos artigos que compreendiam os “rendimentos não expressamente mencionados” – mesmo quando não houvesse esse artigo da Convenção, frise-se – sujeitando-as à tributação nos moldes do antigo Decreto nº 3.000/99, em um verdadeiro treaty override.

Posteriormente, após a contestação judicial por parte de diversos contribuintes, a Receita Federal do Brasil revogou o ADN COSIT nº 01/00 através da edição do Ato Declaratório Interpretativo RFB nº 05/14, que dispunha que o tratamento tributário a ser dispensado a esses rendimentos poderia ser aquele dado aos royalties, aos serviços profissionais ou pessoais independentes ou, por fim, aos lucros das empresas previsto no artigo 7º, a depender do que restasse previsto naqueles tratados.

A questão, porém, nunca se limitou aos denominados serviços técnicos ou de assistência técnica – cujos conceitos per si já causariam suficiente confusão em razão da sua indeterminação. Em 2004, especificamente diante do pagamento de prêmios referentes a seguros contratados no exterior junto a uma empresa seguradora espanhola, a Receita Federal do Brasil expressamente consignou que tais remessas seriam tributáveis pelo IRRF à alíquota de 25% no Brasil, cabendo à Espanha permitir a compensação do imposto pago – como se extrai da Solução de Consulta DISIT nº 554, da 7ª Região Fiscal.

Em agosto de 2018, ao responder uma consulta relativa aos pagamentos feitos em razão da prestação de serviços de resseguro, a Receita Federal do Brasil deixou de apreciar os questionamentos feitos pelo contribuinte acerca da aplicabilidade e dos efeitos das Convenções para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal, equiparando determinados intermediários locais a estabelecimentos nacionais e consignando que “os rendimentos […] estão sujeitos ao imposto de renda na fonte IRRF à alíquota de 25% (vinte e cinco por cento), tendo em vista que o ressegurador exerce atividade de prestação de serviços” ¹ – de forma que o entendimento acerca da inaplicabilidade do artigo 7º dessas Convenções nesta hipótese nunca foi formalmente rechaçado.

Assim é que as incertezas ocasionadas pelo histórico de interpretações equivocadas ou confusas da Receita Federal do Brasil acerca dos termos das Convenções para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal faz, por vezes, as próprias instituições financeiras responsáveis por promover as remessas dos rendimentos se recusarem a efetivá-las sem a retenção do IRRF, com receio de que sejam responsabilizadas solidariamente e/ou sofram penalidades.

Diante disso, não resta alternativa às empresas brasileiras indevidamente submetidas a esse tipo de exigência além de buscar judicialmente o reconhecimento do seu direito de não sofrer com o ônus da tributação.

Em um desses casos, no último dia 23 de janeiro, tivemos êxito em um pedido liminar pleiteado no bojo de Mandado de Segurança impetrado para garantir que uma empresa que contrata seguros na Espanha junto a seguradoras sem estabelecimento no Brasil não mais tivesse que sofrer retenção sobre os pagamentos de prêmios feitos no bojo da contratação de serviços de seguro.

Na decisão liminar o magistrado ressaltou que o serviço de seguros está sujeito aos termos do artigo 7º, da Convenção destinada a Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre a Renda celebrada entre o Brasil e a Espanha, de modo que determinou que a Receita Federal do Brasil se abstenha de exigir a retenção do Imposto de Renda nesses pagamentos.

O mesmo expediente pode ser adotado para todos os contribuintes que contratem serviços que se encaixem no artigo 7º das Convenções para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal e venham a encontrar a mesma espécie de empecilho junto à Receita Federal do Brasil ou às instituições financeiras. Além da Espanha, o Brasil é signatário de Convenções deste gênero com os seguintes países: África do Sul, Argentina, Áustria, Bélgica, Canadá, Chile, China, Coreia do Sul, Dinamarca, Equador, Eslováquia, Filipinas, Finlândia, França, Hungria, Índia, Israel, Itália, Japão, Luxemburgo, México, Noruega, Países Baixos, Peru, Portugal, República Tcheca, Rússia, Suécia, Trinidad e Tobago, Turquia, Ucrânia e Venezuela. É dizer, a mesma pretensão pode ser buscada em situações materializadas em relação a estes outros países.

O Almeida Advogados conta com time especializado para sanar dúvidas e, eventualmente, representar interesses tanto em consultoria quanto em contencioso tributário.


¹ Solução de Consulta COSIT nº 91/18, Coordenação-Geral de Tributação, publicação no Diário Oficial da União em 08 de agosto de 2018.

Escrito por: ALESSANDRO DA COSTA VETTORAZZI e RODOLFO ELIAS BRAZIL

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