
A legitimidade e juridicidade do instituto do third-party funding — ou financiamento por terceiros de litígios — como mecanismo de efetivação do direito de acesso à Justiça, especialmente em ações societárias complexas e de grande repercussão econômica, nas quais o custo de litigar frequentemente representa obstáculo ao exercício pleno de direitos, tem apresentado um crescente interesse na comunidade jurídica brasileira.
O instituto de origem estrangeira, amplamente reconhecido em jurisdições como Inglaterra, Estados Unidos e Austrália, e que vem gradualmente sendo incorporado à prática jurídica estatal e arbitral no Brasil, com respaldo nos princípios constitucionais da ampla defesa, da igualdade processual e da efetividade da tutela jurisdicional, ganhou um novo e importante capítulo de seu reconhecimento com o recente julgamento do Recurso Especial nº 2.171.569/SP pela Terceira Turma do STJ.
O litígio original tinha por objeto ação de reparação de danos por abuso de poder de controle, proposta por acionista minoritário nos termos do art. 246, §1º, “b”, da Lei das Sociedades Anônimas (Lei nº 6.404/1976) e envolveu grande discussão acerca da necessidade de exibição dos contratos de financiamento de litígio, colocando em dúvida se a existência de terceiros financiadores afetaria a legitimidade ativa do acionista e a regularidade processual da demanda.
Na ementa do caso, relatado pelo Ministro Humberto Martins, a conclusão da turma julgadora foi no sentido de que o financiamento de litígios é admitido no ordenamento jurídico brasileiro, e a identidade dos financiadores não afeta a legitimidade do acionista minoritário.
Mas ao que aqui importa, qual a relevância prática deste precedente?
O primeiro deles nos parece ser o precedente fixa um marco interpretativo importante acerca do instituto do third-party funding como instrumento legítimo e recepcionado pela legislação brasileira sob vários aspectos que vão desde princípios constitucionais como do acesso à Justiça e passam por aspectos da autonomia privada e liberdade contratual entre outros.
O segundo aspecto que merece destaque é que o citado precedente traz segurança jurídica a investidores e fundos especializados em financiamento de disputas, delineando os limites éticos e processuais de tal instituto, tais como a necessária preservação da independência técnica do advogado e o dever de sigilo profissional.
A adoção do third-party funding traz, ainda, uma convergência com práticas e soft law internacionais tendentes a modernização do contencioso corporativo internacional, promovendo a integração do sistema jurídico brasileiro às boas práticas reconhecidas em regras da ICC, LCIA e UNCITRAL, que admitem o financiamento externo como legítimo e transparente.
À luz da legislação vigente, conclui-se que o instituto do third-party funding é juridicamente legítimo e compatível com o ordenamento jurídico brasileiro, constituindo instrumento idôneo de promoção do acesso à Justiça, em especial em litígios societários de alta complexidade e relevância econômica.
Indo mais além, ao viabilizar o ajuizamento de demandas com relevante conteúdo jurídico e econômico, o third-party funding contribui para a eficiência e racionalidade do sistema judicial, pois transfere ao financiador grande parcela do risco econômico da demanda, reduzindo o impacto financeiro sobre o litigante e incentivando a seleção de casos com mérito jurídico consistente.
Desde que observadas as premissas de autonomia contratual, transparência, boa-fé objetiva e independência técnica dos advogados, o financiamento por terceiros contribui para democratizar o acesso à jurisdição, sem comprometer a integridade do processo ou a ética profissional.
Recomenda-se que as partes interessadas formalizem contratos de financiamento claros e equilibrados, com definição precisa de direitos, obrigações, sigilo e limites de atuação do financiador, de modo a assegurar segurança jurídica e aderência às melhores práticas nacionais e internacionais.
O Almeida Advogados conta com um time de especialistas em Contencioso Cível Estratégico, liderado pela sócia Andréa Seco e está sempre atento às inovações, de modo a propiciar a melhor atuação processual a todos os seus clientes.
Por Andréa Seco.