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Artigos 1/12/2004

“O protocolo de Quioto e os mecanismos de desenvolvimento Limpo – MDL” – “Clean Development Mechanismo – CDM”

1 – Introdução

Com a aprovação das câmaras baixa (DUMA) e alta do parlamento russo, a Rússia ratificou no dia 04 de novembro último o Protocolo de Quioto e este poderá enfim entrar em vigor a partir de janeiro de 2005. Desta forma, abre-se para os países em desenvolvimento o mercado do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, ou simplesmente MDL, previsto no art. 12 do Protocolo e estimado em vários bilhões de dólares anuais.

O MDL, juntamente com outros dois instrumentos econômicos previstos pelo protocolo (Implementação Conjunta – Joint Implementation e Comércio de Emissões – Emissions Trading), é ferramenta que visa a propiciar o alcance das metas de redução de emissões de gases causadores do Efeito Estufa. Com o objetivo de fomentar o desenvolvimento sustentável em países em desenvolvimento, o MDL financiará projetos que possibilitem em linhas gerais a redução da emissão dos mencionados gases e/ou o seqüestro de partículas de carbono dispersas na atmosfera.

Considerando o porte de sua economia e sua vasta porção territorial, espera-se do Brasil grande participação no procedimento de MDL (inclusive, é brasileiro o primeiro projeto aprovado pelo Comitê Executivo do Protocolo de Quioto, em Bonn na Alemanha). Assim, considerando o grande potencial de negócios que a operacionalização de projetos de MDL pode significar, é o presente memorando para tecer breves explanações acerca do Protocolo de Quioto, esclarecendo ao menos em linhas gerais sua forma de funcionamento.

2 – Histórico

Em 1992, foi assinada no Rio de Janeiro, quando da ECO-92, a Convenção Quadro das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (United Nations Framework Convention on Climate Change – UNFCCC). Tal convenção continuou aberta a assinaturas na Sede das Nações Unidas, em Nova Iorque, até o ano de 1993, tendo entrado em vigor em 1994. A idéia principal inicialmente concebida pela convenção era permitir que os países constantes do Anexo I (a grosso modo os países desenvolvidos) trocassem entre si créditos que representassem a redução de emissões para o cumprimento das responsabilidades assumidas.

Seguiram-se, após a entrada em vigor da convenção, as chamadas Convenções das Partes – COP, que visavam e ainda visam a controlar os rumos da UNFCCC e criar ferramentas que possibilitem sua efetividade.

Neste sentido, na ocasião da COP – 3, realizada em 1997 na cidade de Quioto, foi aprovado o Protocolo de Quioto, no qual os países do já citado Anexo I da convenção se comprometiam a reduzir entre o período de 2008 e 2012 em 5,2% as emissões de gases agravadores do efeito estufa, tendo como baseline as emissões verificadas no ano de 1990.

 

3 – Instrumentos Econômicos de Redução de Emissões

Diante da preocupação em fornecer instrumentos para o cumprimento das metas estabelecidas, o Protocolo de Quioto criou três mecanismos de flexibilidade: Implementação Conjunta – Joint Implementation, Comércio de Emissões – Emissions Trading e Mecanismo de Desenvolvimento Limpo – MDL. Apenas este último entre os três concerne os países considerandos “Não Anexo I” (dentre eles o Brasil) e visa a promover o desenvolvimento sustentável através do financiamento de projetos que proporcionem a redução de emissões ou seqüestro de carbono.

A Implementação Conjunta, por sua vez, está restrita aos países do Anexo I e diz respeito à transferência e aquisição de unidades de redução de emissões resultantes de projetos de mitigação de mudanças climáticas. Já o Comércio de Emissões inclui apenas os países do Anexo B ao protocolo, permitindo-lhes participar do comércio de emissões também com o objetivo de mitigação de mudanças climáticas.

4 – Critérios para Elegibilidade de Projetos de MDL

Através do Acordo de Marraqueche, assinado na ocasião da COP – 7, em 2001, foi definida a regulamentação detalhada para os procedimentos previstos no Protocolo de Quioto, entre eles os projetos de MDL.

Inicialmente, segundo estabelecido no Acordo de Marraqueche, são considerados inelegíveis os projetos:

– Conservação Florestal e qualquer mudança no uso da terra e floresta que não seja florestamento ou reflorestamento;

– Energia Nuclear;

– Geração não sustentável de energia proveniente de recursos de biomassa;

– Centrais hidrelétricas de capacidade instalada superior a 30MW ou com reservatórios de dimensões superiores a 3,0km2.

Por outro lado, os projetos não incluídos na lista acima e que teoricamente representem reduções de emissões de gases de efeito estufa seriam elegíveis. Contudo, devem ser considerados como prioritários os projetos que contribuam para:

– Eficiência energética no uso final (conservação de energia), em suas diversas formas e nos diversos setores, como o de transportes, a indústria, etc.

– Eficiência energética na expansão da oferta de energia, incluindo a redução de perdas na cadeia de produção, transporte e armazenamento de energia;

– Suprimento de serviços energéticos através de energia renovável ou do só de gás natural em substituição de combustíveis fósseis com maior teor de carbono;

– Aproveitamento energético das emissões de metano (CH4) provenientes da disposição de resíduos;

– Redução nas emissões de GEE no setor industrial;

– Florestamento e reflorestamento a longo-prazo, objetivando a expansão da base florestal para o fornecimento de insumos industriais, o florestamento urbano ou a recuperação de áreas degradadas, abandonadas ou desmatadas.

– Redução nas emissões de GEE provenientes da fermentação entérica de rebanhos.

Uma vez desenvolvido o projeto e aprovado pela autoridade nacional encarregada dos projetos de MDL e do Comitê Executivo do MDL, em Bonn na Alemanha, serão emitidos os certificados de emissões reduzidas correspondentes (calculados com base na diferença verificada entre as emissões do cenário de referência – baseline – e o cenário do projeto pelo prazo de 7 ou 10 anos, dependendo do caso).

Resta ainda lembrar que, muito embora o Protocolo de Quioto só entre em vigor a partir de janeiro de 2005, as estimativas avaliam que os valores dos certificados de emissão reduzida deverão girar entre 5 e 10 dólares americanos para cada tonelada de CO2 sequestrada ou não emitida.

5 – Considerações Finais

Sob o ponto de vista jurídico, os instrumentos econômicos trazidos pelo Protocolo de Quioto marcam o início efetivo da atual tendência dentro do direito ambiental e, mais amplamente, dos direitos fundamentas, afastando-se dos tradicionais métodos de comando e controle (obrigação e fiscalização) para aproximar-se de métodos incitativos e econômicos, de forma a agregar vantagens pecuniárias àqueles que buscarem cumprir as determinações formuladas.

No tocante à realidade brasileira e ao cotidiano das empresas e grupos empresariais do país, tem-se nos projetos de MDL importante fonte de financiamentos externos e de, num plano mais elevado, de visibilidade e prestígio internacional. Deve-se ressaltar que estima-se o mercado de MDLs como sendo um mercado de bilhões de dólares (podendo este número se multiplicar no caso da improvável, mas ainda assim materialmente possível, ratificação do Protocolo de Quioto pelos Estados Unidos.

Considerando os interesses específicos da advocacia ambiental e societária, tem-se na concepção e desenvolvimento de um projeto de MDL um emaranhado de estudos jurídicos, convênios, contratos e contatos envolvendo instituições financeiras internacionais (Banco Mundial e BID incluídos), instituições de proteção ao meio ambiente nacionais e internacionais, órgãos públicos (Ministérios, Conselhos, etc), fundos de investimentos e demais empresas e entidades que certamente implicarão grande fonte de trabalho para uma banca de advocacia.

Somente a título exemplificativo e com o intuito de demonstrar a dimensão dos valores envolvidos, o Brasil teve agora em novembro seu primeiro projeto de MDL aprovado pelo Conselho Executivo do MDL, na Alemanha. Trata-se do projeto Nova Gerar, no Estado do Rio de Janeiro e que tem por objetivo a construção de uma usina de geração de energia através da utilização de gases CH4 liberados pela decomposição de lixo doméstico. Estima-se que aproximadamente 10 milhões de toneladas de CO2 deixarão de ser emitidos em 21 anos. Segundo informações obtidas informalmente, estima-se que um fundo financiado pelo Governo Holandês já havia negociado um valor superior a US$ 30.000.000 de dólares pelo projeto.

O que se deve ter em mente é que em nenhuma relação onde haja um contrato regendo as partes, um dos contratantes pode, antes de cumprida sua prestação, exigir o adimplemento do contrato pela outra parte.

Assim, através, de uma visão legal e mais racional da questão é que a Jurisprudência pátria atual, em especial consubstanciada nos novos julgamentos proferidos no Superior Tribunal de Justiça, tem decidido pela regularidade e legalidade do corte no fornecimento de serviço público considerado essencial nos casos de falta de pagamento, mediante aviso prévio, inclusive sob o argumento de que a proibição de tal ato acarretaria o denominado “efeito dominó”, ou seja, “ao saber que o vizinho está recebendo energia elétrica de graça, o cidadão tenderá a trazer para si o tentador benefício. Em pouco tempo, ninguém mais honrará a conta de luz” (Recurso Especial nº 363.943 – MG)..

Pelo exposto, conclui-se pela total possibilidade e legalidade de suspensão do fornecimento de energia elétrica a usuário inadimplente, bem como os recentes julgados que confirmam a possibilidade desta suspensão devem ser ampla e pontualmente respeitados e defendidos, para que não se repitam entendimentos passados que impossibilitavam o exercício de um direito legalmente assegurado, impondo uma visão excessivamente imediata da questão em detrimento da coletividade e da expansão qualitativa e universal do serviço.

1 O protocolo previa para sua entrada em vigor a ratificação por um mínimo de 55 países e que representassem pelo menos 55% das emissões mundiais de CO2. Com a ratificação russa o Protocolo de Quioto atinge, independentemente da adesão dos EUA, os valores de emissão exigidos e pode enfim entrar em vigor.

 

Fonte: Almeida Advogados – Leonardo Palhares

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