Na última quinta-feira (10/03/2022) foi publicada a Lei nº 14.311/2022 no Diário Oficial da União, com disposições sobre o retorno da gestante ao ambiente presencial de trabalho. A nova lei altera a Lei nº 14.151, de maio de 2021, que determinou o afastamento de empregadas gestantes do trabalho presencial, em decorrência do risco de contaminação pela COVID-19 e o risco de vida acentuado nesse grupo de trabalhadores.
Até a sanção da nova lei, assinada no dia internacional de mulher, para gerar um falso simbolismo à medida, a empregada gestante deveria permanecer afastada das atividades presenciais, sem que tivesse prejuízo na remuneração, podendo continuar a exercer atividades por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância.
É importante ressaltar que a Lei 14.151/21 não regulou aspectos importantes deste afastamento, como por exemplo, a responsabilidade pelo pagamento de salário às empregadas caso as atividades fossem incompatíveis com o trabalho à distância. Tal situação gerou insegurança, pois pela ausência de regulação normativa, ficou à cargo do judiciário determinar a responsabilidade por este pagamento. Após breve discussão, a maioria dos órgãos magistrados entenderam pela responsabilidade da Previdência Social em analogia à possibilidade de antecipação da licença maternidade em casos de gravidez de risco.
Após meses de discussões na Câmara, a lei recentemente sancionada autorizou o retorno dessas empregadas aos seus postos de trabalho em três hipóteses:
No entanto, como se vê, mais uma vez a lei não é clara e autoexecutável.
Primeiro, ainda não fica claro se houve o encerramento do estado de emergência no Brasil pela redação da lei. Ressaltando-se que o estado de emergência é diferente do estado de calamidade pública decretado pela necessidade de aprovação de orçamentos emergenciais para o combate à pandemia e renúncia fiscal pela União, sem prévia legislação específica (Decreto Legislativo n. 06/2020). O Estado de Emergência foi decretado em fevereiro de 2020 por meio da portaria 188/2020.
Como a lei agora sancionada não traz revogação expressa, entende-se que o estado de emergência permanece vigente.
O segundo ponto é em relação à imunização completa. Esclarece-se que, com as informações disponíveis, não fica claro, por exemplo, se o ciclo estará completo após a segunda dose, após a dose de “reforço” ou eventuais novas doses. Tal esclarecimento deverá ser feito, portanto, por meio de Portaria do Ministério da Saúde.
Por último e talvez o ponto juridicamente mais controvertido, está a clara prioridade daquilo que constou na redação normativa como “direito fundamental da liberdade de autodeterminação individual, que não poderá ser imposta à gestante que fizer a escolha pela não vacinação […]” perante a saúde coletiva.
Apesar da lei trazer o enaltecimento da possibilidade de recusa à vacinação, o Supremo Tribunal Federal, em sentido contrário, entendeu que a vacinação compulsória ou obrigatória, é diferente de vacinação forçada, e que pode ocorrer por meio de medidas indiretas, como restrição ao exercício de atividades ou de frequentar lugares. (ADI 6.586, na ADI 6587 e ARE 1267879). Assim, priorizou-se, pelo STF, a saúde da coletividade em detrimento do direito individual pela escolha, ao contrário do que apontou a nova Lei.
Por fim, é importante destacar que a lei possibilitou ainda, ao empregador, alterar as funções exercidas por ela para manter o exercício das atividades da gestante em seu domicílio, desde que respeitadas suas condições, não haja prejuízo da remuneração e seja possibilitado o retorno à função anterior quando retomadas as atividades presenciais.
A Lei é importante para a efetiva retomada gradual das atividades laborais existentes antes da pandemia, mas ainda deve ser vista com cuidado já que a pandemia ainda é uma realidade no Brasil, apesar de sua redução gradual nos últimos meses.
Autor: sócio Fernando Bosi