Em vigência desde o dia 29 de Janeiro, a Lei Anticorrupção prevê duras penalidades às pessoas jurídicas envolvidas em atos de corrupção, requerendo, portanto, a atenção imediata das empresas que de alguma forma interagem em sua dia-a-dia com a Administração Pública, para minimizar os riscos das sanções da nova Lei por atos praticados pelos seus prepostos e funcionários. A Newsletter elaborada pelo Almeida Advogados, disseca os principais aspectos da nova legislação anticorrupção e sinaliza para os cuidados a serem desde já implementados pelos sócios e executivos de empresas no Brasil.
Sancionada pela presidente Dilma Rousseff em agosto de 2013, a Lei nº 12.846/2013, também conhecida como Lei Anticorrupção, entrou em vigor a partir de 29 de janeiro trazendo providências essenciais para prevenção e combate a atos contra a administração pública, nacional e estrangeira.
Criada para harmonizar as relações entre empresas e governo, referida lei segue a tendência mundial de lei voltada à prevenção, ao combate e à repressão de atos corruptos, tendo como principais inspirações o “Foreign Corruption Practice Act – FCPA”, promulgado em 1977, nos Estados Unidos, e o “Anti Bribery Act” de 2010 na Grã-Bretanha.
A nova lei pretende ainda internalizar e manter a legislação brasileira em conformidade com os tratados internacionais sobre o tema que o Brasil é signatário, quais sejam (i) a Convenção Interamericana contra a Corrupção de 1996; (ii) a Convenção da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico sobre o Combate ao Suborno de Oficiais Públicos Estrangeiros em Transações Comercial Internacionais de 1997; e (iii) a Convenção da Organização das Nações Unidas contra a Corrupção de 2003.
Imperioso destacar que as normas regulatórias americana e britânica sobre o tema, bem como as convenções mencionadas, pretendem materializar a repressão à corrupção, responsabilizando e criminalizando práticas corruptas, tanto de empresas quanto de oficiais e agentes públicos, estrangeiros ou privados.
Nesta perspectiva, a nova legislação brasileira inova em relação às possibilidades de sanções existentes criando instrumentos específicos para punir as empresas envolvidas em atos de corrupção, que anteriormente se mantinham ilesas, bem como a possibilidade da aplicação – nacional e extraterritorial, visto que o novo diploma legal prevê a possibilidade de condenar a empresa que pratica ato corrupto no exterior.
Anteriormente, as condutas tipificadas e as penas previstas no Código Penal Brasileiro, sejam elas pecuniárias ou restritivas de liberdade, estavam restritas às pessoas naturais que estivessem envolvidas em crimes de corrupção ativa e/ou passiva, quais sejam os diretores/representantes de empresas e os servidores públicos.
Desta forma, a lei já em vigor, dispõe especificamente quanto à responsabilização objetiva administrativa e civil de pessoas jurídicas1.
Dentre as práticas passíveis de sanções no âmbito da Lei Anticorrupção podemos destacar (i) prometer, oferecer ou dar, direta ou indiretamente, vantagem indevida à agente público; (ii) frustrar ou fraudar o caráter competitivo ou qualquer ato de procedimento licitatório; (iii) afastar ou procurar afastar licitante, por meio de fraude ou oferecimento de vantagem de qualquer tipo; (iv) criar, de modo fraudulento ou irregular, pessoa jurídica para participar de licitação pública ou contrato administrativo dela decorrente; e (v) manipular ou fraudar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos celebrados com a administração pública.
No âmbito administrativo, o novo conjunto de regras prevê duras sanções pecuniárias, com multas que podem variar de 0,1% (um décimo por cento) a 20% (vinte por cento) do faturamento bruto do último exercício da instauração do processo administrativo, ou, na impossibilidade de adoção de referido critério, estas poderão ser arbitradas entre R$6.000,00 (seis mil reais) a R$60.000.000,00 (sessenta milhões de reais)2.
Para determinar o valor das multas serão levadas em consideração as peculiaridades do caso concreto, tais como a gravidade da infração cometida, a vantagem auferida ou pretendida, o grau da lesão e a situação econômica do infrator.
Na esfera judicial as pessoas jurídicas que participarem de atos lesivos à administração pública poderão sofrer sanções de (i) perdimento dos bens, direitos ou valores oriundos da infração; (ii) suspensão ou interdição parcial de suas atividades; (iii) proibição de receber incentivos, subsídios, subvenções, doações ou empréstimos oriundos do poder público por prazo que varia de 1 (um) a 5 (cinco) anos; e (iv) dissolução compulsória da pessoa jurídica.
No tocante à hipótese de dissolução da pessoa jurídica, está será determinada quando restar comprovado que a personalidade jurídica é utilizada para ocultar a identidade dos beneficiário das infrações ou caso referida pessoa jurídica seja utilizada habitualmente para promover atos ilícitos.
Cabe pontuar ainda a criação do Cadastro Nacional de Empresas Punidas (CNEP)3, que tem como objetivo reunir e dar publicidade às empresas punidas pelos órgãos e entidades de todas as esferas da administração pública.
Um ponto extremamente interessante e que tem motivado uma série de debates sobre a nova lei é a possibilidade do acordo de leniência4, haja vista o caráter subjetivo desta nova regra e a falta de clareza quanto aos efeitos penais do “acordo” quanto à extinção de punibilidade criminal em caso de celebração.
No entanto, ainda que exista a possibilidade de isenção e/ou redução das sanções previstas na Lei Anticorrupção por meio da celebração de acordo de leniência com o poder público, a maneira mais eficaz de minimizar os riscos de responsabilização da empresa em casos de corrupção é a criação de regras de compliance (ou, conformidade).
A adoção de programas de compliance tem como escopo instituir um conjunto de procedimentos que resultem na transparência das atividades desenvolvidas, e também denúncia, investigação e punição em casos de desconformidade, evitando ainda qualquer desvio nos atos praticados pela empresa ou seus representantes, podendo ser utilizado ainda, quando efetivo, como atenuante das sanções previstas na Lei Anticorrupção5.
Ainda que alguns pontos gerem debate quanto a sua aplicação e eficácia, sabe-se que a Lei Anticorrupção tem como escopo principal fomentar um ambiente de mercado eficaz, trazendo uma série de benefícios para as empresas consideradas “ficha limpa”, como, por exemplo, a concessão de financiamentos com cálculos de taxas de juros mais baixas.
Desta forma resta claro que a nova lei estimula a concorrência e meritocracia na medida em que a corrupção é reprimida e combatida, incitando também que os dirigentes das empresas colaborem de forma rigorosa e efetiva no combate e, principalmente, na prevenção à corrupção.
1 Art. 1º da Lei n° 12.846/2013 – Esta Lei dispõe sobre a responsabilização objetiva administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira.
Parágrafo único. Aplica-se o disposto nesta Lei às sociedades empresárias e às sociedades simples, personificadas ou não, independentemente da forma de organização ou modelo societário adotado, bem como a quaisquer fundações, associações de entidades ou pessoas, ou sociedades estrangeiras que tenham sede, filial ou representação no território brasileiro, constituídas de fato ou de direito, ainda que temporariamente.
2 Artigo 6º da Lei nº 12.846/2013.
3 Art. 22. Fica criado no âmbito do Poder Executivo federal o Cadastro Nacional de Empresas Punidas – CNEP, que reunirá e dará publicidade às sanções aplicadas pelos órgãos ou entidades dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário de todas as esferas de governo com base nesta Lei.
4 Art. 16. A autoridade máxima de cada órgão ou entidade pública poderá celebrar acordo de leniência com as pessoas jurídicas responsáveis pela prática dos atos previstos nesta Lei que colaborem efetivamente com as investigações e o processo administrativo, sendo que dessa colaboração resulte:
I – a identificação dos demais envolvidos na infração, quando couber; e
II – a obtenção célere de informações e documentos que comprovem o ilícito sob apuração.
5 Art. 16. A autoridade máxima de cada órgão ou entidade pública poderá celebrar acordo de leniência com as pessoas jurídicas responsáveis pela prática dos atos previstos nesta Lei que colaborem efetivamente com as investigações e o processo administrativo, sendo que dessa colaboração resulte: § 2o A celebração do acordo de leniência isentará a pessoa jurídica das sanções previstas no inciso II do art. 6o e no inciso IV do art. 19 e reduzirá em até 2/3 (dois terços) o valor da multa aplicável.
Equipe Almeida Advogados