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Artigos 22/3/2007

A Súmula Vinculante e o Poder Judiciário

Introdução

Talvez, o ponto mais importante da chamada Reforma do Judiciário, decorrente da Emenda Constitucional n° 45/04, tenha sido a instituição da denominada “súmula vinculante”, expressamente disciplinada no texto constitucional em seu artigo 103-A e parágrafos.

De acordo com o citado artigo, o Supremo Tribunal Federal poderá aprovar, depois de reiteradas decisões envolvendo matéria constitucional, súmula que terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública direta e indireta, e ainda proceder à sua revisão e cancelamento de acordo com o previsto em lei.

No entanto, em que pese o esforço do legislador em buscar alternativas com vistas a tornar o Poder Judiciário mais ágil no julgamento das ações judiciais, a questão ainda é polêmica, motivando acalorados debates entre aqueles que festejam seus propósitos e os que a consideram como um instituto que infringe o princípio da separação dos poderes, do livre convencimento do juiz, dentre outros.

Celeridade na Solução dos Conflitos de Interesses

Não obstante as respeitáveis opiniões em sentido contrário, a súmula vinculante representa um avanço. Não se pode considerar razoável que ações judiciais, não raramente idênticas em objeto, causa de pedir e pedido, não possam ter um andamento mais célere quando juízes, tribunais inferiores e superiores já tenham entendimento pacificado acerca da questão posta a julgamento.

Argumento frequentemente utilizado por seus opositores seria o de que a súmula vinculante afrontaria o princípio da separação dos poderes baseado na premissa de que os juízes assumiriam o papel de legisladores. Tal alegação, no entanto, é frágil na medida em que paralelamente às leis, há normas que se originam de outros órgãos públicos que igualmente contribuem para o regramento das condutas sociais. Daí por que, não se pode alegar a violação do princípio em referência.

Nesse sentido, a juíza federal Mônica Sifuentes alerta para o fato de que embora a lei seja o mais importante instrumento regulatório das condutas sociais, não é, todavia, o único, uma vez que as medidas provisórias editadas pelo Poder Executivo, os regulamentos e instruções normativas expedidos pelo Banco Central, agências reguladoras, dentre outros, igualmente se classificam como normas que desempenham função semelhante à da lei. [1]

A súmula vinculante, portanto, se revela como um importante instrumento a ser utilizado na tentativa de desafogar o Poder Judiciário da enorme quantidade de processos que aguardam anos para julgamento nas abarrotadas prateleiras dos Fóruns e Tribunais brasileiros.

Obrigatoriedade ou Não de sua Aplicação? 

Alguns doutrinadores ao analisarem a súmula vinculante identificaram o que representaria o “calcanhar de Aquiles” do instituto. Nesse sentido, alegam os mesmos que não há previsão de penalidade pela sua não aplicação pelos julgadores, daí por que tal instituto seria de pouca ou nenhuma utilidade considerado o fim buscado pelo legislador constitucional quando de sua instituição, qual seja, o de proporcionar rapidez no julgamento das ações judiciais.

Contudo, ainda que não haja obrigatoriedade de sua adoção em virtude da inexistência de previsão expressa de penalidades por sua não aplicabilidade, a súmula vinculante, somente pelo fato de estar expressamente prevista no texto constitucional, poderá levar os magistrados a observarem-na quando dos julgamentos dos casos concretos aos mesmos submetidos.

Apesar da ausência expressa de penalidades, a Constituição Federal estabeleceu a “reclamação” como instrumento viável a atacar o ato administrativo ou a decisão judicial que contrariar súmula que deveria ser aplicada ou, ao contrário, indevidamente aplicada. Nessa hipótese, o Supremo Tribunal Federal ao julgá-la procedente, anulará ou cassará a decisão judicial objeto da reclamação e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso. [2]

Agiu bem, portanto, o legislador ao instituir a “reclamação” como instrumento apto a levar ao conhecimento do Supremo Tribunal Federal a não aplicação de súmula vinculante no julgamento de uma ação judicial. Isto por que, a previsão de sanções mais severas aos magistrados certamente traria reflexos negativos ao Poder Judiciário, principalmente no que diz respeito aos princípios do livre convencimento e independência dos juízes, cuja observância reputa-se de fundamental importância em um estado democrático de direito.

Conclusão

Longe de procurar elencar todos os prós e contras acerca da súmula vinculante, o presente trabalho procura apenas trazer algumas reflexões acerca desse instituto sob a perspectiva da busca de soluções para um sério problema que vem se agravando a cada ano no Brasil, qual seja a demora da prestação jurisdicional.

Essa morosidade, além de levar aos jurisdicionados à descrença no Poder Judiciário como órgão solucionador de controvérsias, ainda contribui para uma permanente sensação de insegurança jurídica gerando como principal reflexo, uma forte barreira ao desenvolvimento econômico do país.

A Emenda Constitucional n° 45/04 que dispôs sobre a tão esperada Reforma do Judiciário finalmente fez constar expressamente no texto constitucional um mecanismo – súmula vinculante – que há muito vem sendo discutido entre os operadores do direito quando o assunto diz respeito à tutela jurisdicional e sua real efetividade quando da entrega aos jurisdicionados.

Embora não haja previsão expressa de norma que determine penalidade específica nas hipóteses de sua não aplicabilidade, o só fato de estar contida expressamente na Constituição Federal já revela um importante fator a exortar os magistrados de todas as Instâncias de julgamento a aplicar a posição sedimentada e pacificada quanto a matérias que não comportam julgamentos dissonantes em decorrência de sua análise à exaustão.

A Constituição Federal de 1988, tendo previsto a assistência jurídica integral e gratuita aos mais necessitados, facilitou o ingresso destes em juízo, o que, sem sombra de dúvida, significou um avanço para o Brasil em termos de cidadania. Porém, de nada vale a democratização do acesso ao Poder Judiciário se a prestação jurisdicional não se realiza em um prazo, ao menos, razoável. Nesse sentido, a súmula vinculante representa uma nova esperança não somente em relação à qualidade da prestação jurisdicional, mas, sobretudo, na celeridade de sua prestação aos jurisdicionados.

——————————————————————————– [1] SIFUENTES, Mônica. A súmula e os esqueletos. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 466, 16. out. 2004. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5839. Acesso em: 21 dez. 2006.

[2] CF, art. 103-A, § 3°

Fonte: Almeida Advogados
– Cassio Augusto Ambrogi

 

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