A arbitragem é um método alternativo para solução de controvérsias, pelo qual as partes escolhem um ou mais profissionais especialistas em determinado assunto para solução de sua controvérsia. Diferentemente do que ocorre com os processos judiciais, que, por muitas vezes, ficam engessados por longos anos à mercê de julgamento pelos mais variados órgãos do Poder Judiciário, os procedimentos arbitrais são, em regra, mais ágeis e dotados de maior flexibilidade, podendo, inclusive, serem costurados sob medida para melhor atender os interesses das partes em disputa.
Embora a origem dos procedimentos arbitrais remeta as reuniões de cúpula dos cidadãos atenienses da Grécia Antiga, é justamente na atualidade que o instituto ganha notoriedade e é aplicável comumente ao redor de todo o globo para uma solução eficiente, célere e flexível de litígios empresariais.
Isso porque, seja em prestígio à celeridade das arbitragens em relação ao processo civil tradicional, seja em virtude da manutenção das informações com sua inerente e necessária confidencialidade, o procedimento arbitral traz enormes benefícios ao empresariado, de modo que nos dias atuais é o método alternativo de solução de conflitos com maior utilização no Brasil e no mundo1.
Para além das comuns arbitragens comerciais, a aplicação da arbitragem em matéria tributária tem sido uma constante nos fóruns internacionais2 e organizações globais, à exemplo da OCDE, que vêm incentivando e recomendando sua utilização para evitar dupla tributação internacional e para simplificar os contenciosos tributários que perduram, normalmente, por anos a fio à espera de uma solução.
O momento atual vivenciado pelo País, em que se discute importante reforma tributária buscando clara simplificação na cobrança de tributos, não poderia deixar de contemplar as técnicas alternativas de solução de litígios. Foi justamente com esse propósito que a Senadora Daniella Ribeiro (PP-PB) propôs, no último dia 03 de setembro de 2020, ao Congresso Nacional, a criação de um regime especial de arbitragem tributária, cujo objetivo é possibilitar a instauração de um procedimento arbitral no curso da fiscalização tributária, visando “prevenir conflitos mediante solução de controvérsias sobre matérias de fato” 3.
Nota-se ainda que o escopo proposto pelo referido Projeto de Lei visa a solução de conflitos que sejam anteriores à constituição do crédito tributário, podendo ser aplicados em duas situações: (a) consulta fiscal; e (b) quantificação de crédito já reconhecido judicialmente e passível de compensação, sendo sua aplicabilidade vedada aos casos de crédito tributário que já tenha sido constituído (Art. 1º, parágrafo único), os quais sabe-se ser a imensa maioria.
Embora a iniciativa seja louvável pela tentativa de outorgar ao contribuinte e ao Fisco um método mais simples, célere e menos oneroso para resolução de conflitos de natureza tributária, a proposta apresentada deixa de considerar importantes situações e características dos procedimentos arbitrais, como a flexibilidade e a autonomia da vontade das partes, ao menos se considerados aqueles já conhecidos e reiteradamente utilizados pelo empresariado brasileiro.
Com efeito, a autora do Projeto de Lei destaca que esse procedimento é denominado como “especial”, eis que, não obstante chamado de arbitragem, deverá possuir um tratamento próprio, distinguindo-o da já conhecida arbitragem comercial em sua fórmula tradicional.
Para tanto, criam-se figuras inexistentes nas arbitragens que hoje conhecemos, como (i) a presença de um árbitro desempatador (Art. 9º do Projeto de Lei) para “situações que, em razão da controvérsia e após votação não unânime, assim demandem”4; e (ii) requisitos específicos para o exercício da função de árbitro (Art. 4º, §9º), cuja eficiência não se conhece e parece, em uma primeira análise, gerar mais barreiras do que outorgar soluções.
A prática demonstra que as arbitragens são procedimentos flexíveis e customizáveis para melhor atender aos interesses de seus promoventes, sendo que as adaptações a fórmula base são comumente feitas por meio da adoção de regulamentos das instituições arbitrais. Nota-se, portanto, não haver necessidade da criação de leis específicas para arbitragem comercial, outra para arbitragem em matérias relacionadas à administração pública e quiçá um terceiro ordenamento para os procedimentos arbitrais trabalhistas, o que efetivamente diminuiria o prestígio e a força da já consolidada Lei de Arbitragem brasileira, bem como suprimiria a importância dos regulamentos das câmaras de arbitragem.
Ante essas considerações, reconhece-se a tentativa de criação de mecanismo mais simples, célere e flexível para soluções de problemas entre contribuintes e Fisco, sendo certo que os métodos alternativos de soluções de conflitos têm muito a contribuir para os órgãos públicos e para o empresariado nacional, podendo, ao final do dia, evitar sanções tributárias desnecessárias.
Há que se considerar, porém, que a forma como proposta certamente ainda demanda uma maior análise e cuidado por parte do bem intencionado legislador, sob pena de não apenas criar regras próprias, mas também de obstruir o bom e correto avanço da arbitragem em sua fórmula clássica em território nacional.
O Almeida Advogados conta com profissionais que possuem vasta experiência na defesa das prerrogativas dos contribuintes e está à disposição para seguir colaborando com a criação de normas e regulações que visem uniformizar os procedimentos de implementação de métodos alternativos de solução de conflitos.
Escrito por:
Eduardo Machado Tortorella
Rodrigo Petry Terra