*Rodrigo Mattos Sérvulo de Faria
Desde a entrada em vigor da Convenção do Trabalho Marítimo (CTM) no Brasil, em 07 de maio deste ano, através do Decreto nº 10.671/21, a expectativa de sua aplicação pela Justiça do Trabalho vem sendo o principal ponto de atenção dentre as empresas de cruzeiros que operam em águas territoriais brasileiras.
Isso porque, pairava sobre as relações de trabalho envolvendo tripulantes verdadeira insegurança jurídica, já que poucas vezes foram aplicadas as convenções internacionais e acordos coletivos que regem o trabalho a bordo para todas as nacionalidades.
Assim, a complexidade e as particularidades que envolvem o trabalho marítimo encontraram no histórico protecionista da Justiça do Trabalho – que funciona como “bastião” do equilíbrio da relação empregatícia frente às desigualdades socioeconômicas próprias desta relação, espaço para distorções das discussões sobre o tema.
Diante deste cenário de incertezas, é necessário compreender que a CTM foi elaborada pela Conferência Geral da Organização Internacional do Trabalho (OIT) em 2006, e tem como principal objetivo possibilitar que os trabalhadores marítimos, independentemente de sua nacionalidade, tenham as condições da sua relação de trabalho regidas por uma única norma, sendo-lhes conferidos uma série de direitos[1] para o desenvolvimento de suas atividades em qualquer localidade do mundo.
Percebe-se, portanto, que ao introduzir a CTM ao seu ordenamento jurídico, o Brasil busca dar tratamento específico aos trabalhadores marítimos, uma vez que a referida norma internacional é resultado da consolidação do conteúdo de 68 convenções e recomendações da OIT para o setor marítimo.
Por tal razão, ainda que tardia, a ratificação da CTM pelo Brasil[2] foi muito festejada, uma vez que não há na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), tampouco em outra regra constante do nosso ordenamento jurídico, norma que tratem do trabalho embarcado.
O debate sobre a norma aplicável para discutir os direitos dos trabalhadores marítimos não é nova e a batalha judicial é travada há muitos anos na Justiça do Trabalho sem uma uniformização sobre o tema, dando ensejo a insegurança jurídica e, consequentemente, prejudicando o incremento da atividade econômica no Brasil.
A luz no final do túnel tem como origem o Tribunal Superior do Trabalho (TST), o qual em recentes decisões já sinalizou mudança do posicionamento majoritário de suas Turmas[3][4][5], no sentido de afastar a aplicação do princípio da norma mais favorável em privilégio das regras contidas na CTM em razão de serem específicas à realidade do trabalhador contratado para laborar em navio de cruzeiro que navega em águas nacionais e internacionais.
Para o futuro, o que se
espera é que a CTM seja reconhecida como a norma a ser aplicada aos contratos
internacionais dos trabalhadores marítimos de modo a, enfim, pacificar a insegurança
jurídica causada pelas divergências de entendimentos nas cortes trabalhistas,
abrindo espaço para o fomento da atividade de cruzeiros marítimos e do turismo
no Brasil.
[1] Tais como idade mínima, horas de trabalho e descanso, alimentação e proteção à saúde e segurança dos trabalhadores, inclusive quanto a prevenção de acidentes, entre outras disposições.
[2] A Convenção sobre o Trabalho Marítimo foi aprovada na Conferência de fevereiro de 2006 da OIT.
[3] Recurso de Revista – 00001829-57.2016.5.13.0005, Relator Ministro: Alexandre Luiz Ramos. 4ª Turma, Data de Publicação: 01/02/2019.
[4] Agravo de Instrumento em Recurso de Revista – 1268-93.2017.5.13.0006, Ministro: Márcio Eurico Vitral Amaro. 8ª Turma, Data de Publicação: 01/02/2019.
[5] Decisão Monocrática – 0000426-87.2015.5.09.0041, Ministro Breno Medeiros. 5ª Turma, Data de Publicação 29/08/2019.